COMIDA. Verdades ligadas às necessidades fisiológicas são as únicas universais, e todo mundo come. Existem diferentes culturas, e diferentes formas de se alimentar. Existe excesso e escassez, existe gente obesa e gente magra, bem nutridos e supernutridos (e isso não se refere à circunferência da barriga, veja bem).
Mas comida é, essencialmente, política. “Ain, Paulla, lá vem você meter política na história”. Mas é, gente, não tem como fugir. Comida é essencial para a nossa saúde, e aqui entram os agrotóxicos utilizados, os produtos químicos, o teor nutritivo. Aí tem a política, com os muito subsídios dados às empresas (em troca de apoio político, de práticas econômicas), lucros em políticas públicas, como merenda escolar. Agronegócio (spoiler: o agro não é pop!), e entra aí meio ambiente, desmatamento, queimadas, desapropriação de indígenas, quilombolas. E ainda publicidade, vendendo coisas que não precisamos comer, mas são terrivelmente lucrativas, e a indústria farmacêutica, lucrando com nossas doenças provocadas por esse processo (sabia que a empresa que mais vende agrotóxicos no mundo é dona de uma das maiores farmacêuticas também?)…
São tanto assuntos correlacionados, tantos vieses, que eu nem sei no que focar!
Já há alguns anos eu tento fazer escolhas alimentares conscientes. Não estou entrando aqui no mérito de QUEM pode escolher e quem não pode, ou de culpar as pessoas por ouvirem péssimos profissionais com interesses escusos, ou ainda de quem fica na ignorância “porque quer” (mexer no prato das pessoas é mexer com um vespeiro emocional e cultural). Mas ler tudo o que li, pesquisar, me fez ter uma visão muito, muito diferente do que coloco no prato.
Como essa semana chegou um livro que tô paquerando desde o lançamento, decidi aproveitar para fazer um compilado dos principais livros que me impactaram nessa temática, e espero que seja útil para quem também se interessar.

Donos do Mercado, de João Peres e Victor Matioli – Abro com esse pois é o que estou lendo agora, e o que me fez escrever esse post. Essencialmente trata de como o monopólio (duopólio, que seja) das redes de supermecados no país impactam nossa forma de comer. Eles trazem o histórico, como era o “mercado de mercados” antes das gigantes, como isso muda nossa forma de se relacionar com a comida, e mais: como isso impacta toda uma rede de fornecedores, tanto dos industrializados quanto (e principalmente) dos produtos frescos. Entrevistam produtores, atravessadores, funcionários das redes, muitos sob anonimato pois haverão/haveriam retaliações. Vocês não tem noção do PODER das empresas envolvidas, de quantos quebraram e podem quebrar por causa delas. A leitura ainda tá em andamento (eu simplesmente comecei a ler quando abri o pacote da editora), mas já tô cheia de questões (como podem ver por esse post).

Em defesa da comida, Michael Pollan – Acho que esse foi o livro que mudou tudo pra mim, meu pontapé para repensar o que eu trazia para casa, o que eu coloco no corpo. A linguagem do Pollan é muito acessível, e ele parte desde 1800 e bolinha, explicando como o que chamamos de “comida” hoje não tem nada com o que nossos avós chamavam; como nutricionismo é diferente de nutrição; porque margarina é SIM um troço do capeta; como as indústrias lucram/lidam com isso, e como fugir um bocado dessa armadilha de se alimentar nos dias atuais. Mais dois livros dele que gosto MUITO e recomendo demais são o Dilema do Onívoro (não é meu favorito, mas é válido; foi base para um documentário muito interessante) e o Regras da Comida.

Sal, açúcar, gordura, Michael Moss – Se o livro do Pollan foi o pontapé, esse aqui foi confirmação de tudo. Essencialmente Moss descreve, em detalhes, a indústria alimentícia. Como eles utilizam essas três substâncias mágicas do título para montar produtos alimentares que viciam, que provocam impulsividade, que não agregam à saúde. E é um estudo profundo MESMO, desde os estudos em laboratório até as técnicas publicitárias extremamente agressivas e políticas públicas que fazem, me desculpem o palavreado, cair o cu da bunda! Foi lendo esse que eu parei de tomar refrigerante, inclusive.

Uma verdade indigesta, Marion Nestle (esse já tem comentário aqui no blog) – Esse foi o livro que me agregou menos em termos de novidades, mas porque ao lê-lo eu já estava bastante avançada nos conhecimentos gerais. Só que, diferente dos outros títulos, esse toma como ponto de partida a visão dos nutricionistas. Sim, esse pessoal que teoricamente tá aí para nos ajudar a comer bem, a alimentar e nutrir o corpo, mas… não é sempre que acontece. E Nestle fala bastante sobre conflito de interesses, subsídios de pesquisas bancados por empresas, ética profissional da nutrição.

Pandemia e agronegócio, Rob Wallace – Sendo sincera, esse eu ainda nem li. Comprei na pré-venda e entrou numa fila semi interminável. Mesmo tendo furado várias posições, ainda não chegou o momento de ler – na verdade, eu tô fugindo dele porque sei que vai terminar de desgraçar minha cabeça e me matar de raiva da humanidade. Mas tá aqui, comprado, ocasionalmente folheado, e eu recomendo muito para quem se interessa pelo assunto. O porém: a linguagem dele não é tão acessível quanto a dos outros títulos; se você não está acostumado a uma leitura mais densa, pode ser um cadinho puxado – mas não é impossível, de forma alguma.
MAIS: O livro Nutricionismo, de Gyorgy Scrinis, base para grande parte dos estudos do Pollan, tá em pré-venda, chegando ao país, e eu já não me contenho de vontade de colocar as patinhas nele!
RELACIONADOS: Se você quer saber um cadinho mais sobre o assunto, as minhas indicações atuais seriam
Podcasts:
Comida saudável para todos, da Juliana Gomes, maravilhosa. Essa mulher lê todas as publicações possíveis sobre indústria agro, agrotóxicos, políticas públicas sobre alimentos, e resume explicadinho, bem desenhadinho, então mesmo quem não conhece bem do assunto consegue entender.
Vai se food, da Ailin Aleixo, pessoal conhece ela como jurada do Top Chefe, mas eu não vejo isso e nunca tinha ouvido falar. Mas ela traz desde papos sobre comidas e culinárias específicas (o episódio sobre comida italiana mora no meu coração!) até questões sociais, sempre passando por políticas e impacto social, e eu ouço sempre assim que sai.
Prato cheio, da equipe do site O Joio e o Trigo, que fala sobre as implicações políticas da alimentação – os impactos em todas as áreas, na resistência, na construção cultural. Eles também são bastante didáticos, e alguns episódios me deram mais que um aperto no coração. São os responsáveis pelo livro “Donos do Mercado”, descrito aí em cima, assim como co-editores de vários outros (com a Editora Elefante) que eu já quero MUITO!
Documentários:
Suspeitíssima para falar, assisti quase tudo que passou pela minha mão sobre os assuntos comida e nutricionismo. Tem a página de indicação de documentários aqui no blog – que, sorry, tá desatualizada faz tempo, mas juro que vou dar alguma atenção a ela em breve – e recomendo que dêem uma passada lá.
Blog:
A Ana Granziera (que lançou livro recentemente, já tem comentário aqui) tem um blog maravilhoso que acompanho há dez anos, pelo menos. Ela fala sobre comer comida de verdade, cozinhar, slow living (não é a definição que ela dá, mas é o que eu vejo – nem sempre precisamos definir as coisas) e foi lá com ela que descobri o Pollan. Os textos são deliciosos, em diversos aspectos, e eu indico demais, demais.
Oi, Paulla!
Sugiro pra sua lista o “Fominismo: quando o machismo se senta à mesa”. O recorte é um tanto diferente do adotado pelos títulos que você listou no post, mas pode ser mais um olhar.
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Oi Izabel! Eu tô com esse e a Política Sexual da Carne na lista. São recortes bastante diferentes, mas como eu escrevi: comida é política sempre, então são super válidos também 🙂
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